segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

ARTE FUNERÁRIA: relato de experiencia O CEMITERIO COMO ESPAÇO EDUCATIVO

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE ICHI/UAB/SEAD POS-RS RIO GRANDE DO SUL: SOCIEDADE, POLITICA E CULTURA Metodologia do Ensino de Ciências Humanas Profa. Msc. Graciele Martini de Azevedo
PROPOSTA INTERDISCIPLINAR: O CEMITERIO COMO ESPAÇO EDUCATIVO DA ARTE E HISTORIA
Maria Cristina Pastore¹
crisrgs2000@yahoo.com.br
INTRODUÇÃO
Este relato tem por objetivo analisar a execução da ação pedagógica e seus resultados observados nas respostas dos alunos do 8º ano Azul² da Escola Estadual Nossa Senhora Medianeira na cidade do Rio Grande/RS aos questionamentos realizados em dois momentos distintos: antes da exposição dialogada e apos a saída de campo. A pesquisa tem por interesse observar a metodologia aplicada da saída de campo, com o intuito de perceber o nível de aprendizado e as relações que os alunos conseguem traçar durante a experiência. São tentativas de diagnosticar qual o nível de conhecimento prévio que o aluno possui relacionado ao tema estudado e como as informações que recebe durante as aulas influencia sua percepção de mundo. Qual a parcela de aprendizado desse conhecimento adquirido será útil para a vida? O que poderá ser apreendido em um espaço educativo invisível para a maioria das pessoas no contexto histórico, patrimonial e cultural? Nesse sentido Brandão nos convida a pensar em seu livro “O que é educação?”, que educação pode acontecer em qualquer lugar, espaços são ofertados de forma generosa, basta um olhar atento para perceber onde existe algo para ensinar e aprender. Estamos interligados pelo aprender e a todo o momento as conexões são realizadas. Trocas de conhecimento podem ser efetuadas em qualquer ambiente e o cemitério com seu patrimônio cultural, apresentando um museu a céu aberto, perpetua nossa identidade nas memorias sociais guardadas neste local inusitado e causador de estranhamento.
Apresento esse relato de experiência como tarefa exigida da disciplina de Metodologia do Ensino de Ciências Humanas- professora Msc. Graciele Martini de
Azevedo- POS-RS: Rio Grande do Sul: sociedade politica e cultura da Universidade Federal do Rio Grande/RS - FURG - na modalidade EAD. Nessa disciplina discutimos o papel da escola na atualidade, a formação de professores, a interdisciplinaridade e como as diversas linguagens da arte podem contribuir para operacionalizar a aula produzindo interesse e motivação. Nesse sentido a metodologia usada da saída de campo e analise de dados parece expor conceitos pertinentes as reflexões e revisões das praticas do professor. Porem as analises dos procedimentos e considerações sobre a aplicação da metodologia merecem maior investigação e interpretação, para tanto continuaremos com a pesquisa em outras escolas.
A proposta pode se constituir interdisciplinar integrando a Arte, Historia. Geografia e Português, como parceira nas atividades, o que deve ser conversado com a direção da escola e com os professores das disciplinas. Assim ampliando a zona do envolvimento temático, auxiliando ao aluno realizar as operações mentais necessárias para organizar o pensamento em relação ao que está aprendendo.
A interdisciplinaridade como um processo integrador responde aos anseios da preocupação dos profissionais em educação, de relacionar os conteúdos com a realidade do aluno, construindo visões panorâmicas e aglutinadoras do saber no sentido de envolver o educando. A interdisciplinaridade é cruzar saberes (PERRENOUD,2000)
PROPOSTA
Com objetivo de demonstrar a necessidade da aproximação do adolescente dos assuntos referentes ao morrer, da memoria social e cultural pertencente ao local da experiência e devido ao encantamento e a admiração surgidos na visita ao acervo escultórico, podemos problematizar por que o assunto morte e suas especificidades não são abordadas como conteúdo disciplinar.
A partir da preocupação em provocar mudanças de atitudes no adolescente a respeito da morte, considerando a abordagem no assunto no ambiente escolar, as reflexões sobre o reconhecimentos da morte e sua
influencia na maneira de viver em relação ao outro e respeito a vida, tendem serem mais explicitas e frequentes, ampliando o debate para o âmbito familiar. Tema afastado dos debates familiares e escolares, conforme o sociólogo alemão Norbert Elias esclarece em suas pesquisas; " A dificuldade está em como se fala as crianças sobre a morte, e não no que lhes é dito."( ELIAS,2001 p. 26).
Perceber as formas de dialogar sobre assuntos tabus em sala de aula é percorrer caminhos não trilhados, consequentemente, sem orientação das possibilidades que se abrem ao estudo. Os planos de aula foram articulados para que no quarto encontro ocorresse a saída de campo ao cemitério católico da cidade de Rio Grande/RS. As metodologias de expor o conteúdo foram apresentadas nos planos de aula 01, 02 e 03, e constaram de textos, cruzadinhas, jogos educativos, incentivo a memoria com objetos familiares antigos, entre outras formas de explanação.


Fig. 01 Alunos em visita ao cemitério (Foto realizada pela autora)
A arte cemiterial ou arte funerária acompanha o homem desde o inicio da civilização. A preocupação das civilizações primitivas com os rituais, com a decoração, a arquitetura, as praticas mortuárias, desde as cremações ou praticas menos convencionais, exercem a pretensão de despertar o interesse do aluno no
assunto. Doberstein, 2002 em suas considerações sobre o tema das esculturas funerárias nos apresenta o termo obra estatutárias, desta forma foi possível apresentar aos alunos o estudo do escultor/estatutário Matteo Tonietti em Rio Grande a partir das estatuas produzidas por esse artista italiano, presença marcante com suas obras na cidade.
Sob o viés da educação histórica BARCA, 2001, indica que o meio familiar, a comunidade local, a mídia, especialmente a tv, constituem fontes importantes para o conhecimento histórico dos jovens, que a escola não deve ignorar nem menosprezar, e o professor deve contribuir para modificar a compreensão do pensamento histórico no qual os princípios estão centrados na forma como alunos e professores pensam historia. A integração do tema articulando arte, geografia tentando direcionar para o processo da interdisciplinaridade e contribuindo ao se incluir no processo do passado interferindo no futuro e agindo no presente, contribui para instigar o pensamento histórico. Trabalhar esses princípios nos ambientes possíveis de ofertar conhecimento como o cemitério, museu a céu aberto, permite explorar conforme BARCA 2001 os significados do pensamento humano e da ação humana.





FIG. 02 Escultura no cemitério católico de Rio Grande/RS
Foto de aluna

As oportunidades de relacionar os espaços da ação humana, as dimensões temporais, passado presente e futuro com as atividades desenvolvidas em sala de aula, estão permeadas de experiência cotidiana. Conectar esses mundos, sala de aula, espaços urbanos carregados da presença histórica e cotidiana tem penetrado profundamente no pensamento dos educadores. Nesse sentido pesquisas centradas na teoria da consciência histórica no campo da didática, buscam metodologias para aproximar a aprendizagem histórica com o cotidiano, com a vida. Existe uma reflexão da didática da historia.
Buscamos ampliar o campo metodológico, tentando inovar, focando despertar e incentivar a observação, a prática e a contextualização. Entretanto existe a necessidade do profissional de possuir habilidade na transposição didática, adequar os conhecimentos universitários à realidade do aluno. (PASTORE,2013)
O desenvolvimento das habilidades do profissional durante o curso universitário corrobora para que o seu desempenho em sala de aula seja de compromisso com a educação de qualidade e tenha a conscientização de exercer a atividade docente de forma ética, adquirindo hábitos de pesquisa e buscando a qualificação para exercer a arte educação, promover aprendizado histórico e se perceber como sujeito operante do processo de ensinar/aprender. Estimulamos durante todo o percurso da experiência a reflexão sobre a relação do local da saída de campo, o cemitério, entrecruzando com problemática do falar em morte e seus arcanos como praticas sociais e históricas. Objetivamos com e através dessas atividades, a possibilidade dos adolescentes de se apropriarem desse conhecimento e da relação que a experiência pedagógica interdisciplinar pode auxiliar na formação do individuo critico perante a uma sociedade alheia às questões sobre morte. Criar probabilidades de exercer a liberdade e o agir de forma empírica em questões relacionadas com a vida e a morte, facilitando a abertura de dialogo nas demandas aqui analisadas e
afastadas do convívio comunicativo entre as famílias e também do cotidiano escolar, são questões a serem analisadas. A partir do local escolhido, a configuração territorial proporciona explorar as possibilidades. O desafio é criar possíveis metodologias que provocam reflexões e sejam diretamente ligadas ao processo formativo do aluno como cidadão consciente de seu papel na sociedade e no mundo. Completa as projeções desse trabalho ações que incentivam à pratica artística, o conhecimento histórico e estimulam o jovem a desenvolver imaginação relacionada ao tema, ao local, e se apropriar das descobertas para a vida.
As narrativas dos 20 alunos aos questionamentos apresentados foram sistematizadas entre o sim e não apenas para levantamento de dados. As questões deverão sofrer aprofundamento e embasamento teórico, além de incluir mais alunos de outra escola na pesquisa. Aqui estamos apresentando a analise no universo de 20 alunos.
Conhecem algum museu?
Respostas positivas 08
Respostas negativas 12

O que é escultura?
Respostas positivas 15 (sabiam)
Respostas negativas 05 ( declaram que nao sabiam )

Realizaram algum procedimento escultórico?
Respostas positivas 03
Respostas negativas 17

A família conversa sobre morte e o morrer?
Respostas positivas 08
Respostas negativas 12

Esteve alguma vez no cemitério?
Respostas positivas 13
Respostas negativas 07

Motivos do comparecimento ao cemitério
Sepultamento de parente 07
Visita 03
Não responderam 03

Observamos que em algum questionamento as respostas indicam um não conhecimento sobre o que foi perguntado. É preocupante na medida em que as idades e o ano em que se encontram, supostamente, deveriam ter vivenciado as experiências que proporcionariam um nível de conhecimento plausível. Nesse sentido o processo da interdisciplinaridade pode contribuir. Rever esses posicionamentos como professores é refletir sobre as praticas educacionais. O uso da saída de campo proporciona ao aluno a atmosfera favorável para demonstrar sua curiosidade, sente-se a vontade para perguntar, sente-se livre das paredes que representam um lugar fechado, com determinadas regras. Na saída de campo a alegria é contagiante, proporcionando um aprender naturalmente.
O roteiro sugerido é forma de interpretar as ansiedades dos alunos de saírem da sala de aula e buscarem alternativas de vivenciar situações com relação aos momentos da vida, ao cotidiano, do aprender a viver. Aprendemos como nascemos, aprendemos como somos concebidos, aprendemos como funciona nosso organismo, mas não nos ensinam a conhecer os processos de viver nem os rituais de morrer. Desde muito tempo o ser humano preocupa-se com os rituais da passagem da vida para a morte, mas os procedimentos para sepultar os mortos e assuntos sobre a morte, nunca estiveram tão afastados do cotidiano dos alunos. A partir da observação da escultura funerária foi possível aproximar o adolescente do conhecimento que rodeiam os mistérios da morte e do processo de morrer. O local da experiência, o cemitério, aqui apresentado como museu a céu aberto, abarcou a busca para compreender os sentidos das tradições de sepultamento, emergindo em um mundo invisível e problemático.
A visita ao cemitério provocou admiração, curiosidade e através das esculturas funerárias foi possível sentir a beleza e perceber a mensagem que deve ser considerada. Uma mensagem preenchida de aspectos simbólicos, a perpetuação do corpo e a lembrança do ente querido. Podemos pensar em desdobramentos para o tema sugerido.
REFERENCIAS
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